<

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

METRO MONDEGO VS LINHA DA LOUSÃ


ARTIGO DO JORNAL "O TREVIM" DA LOUSÃ

(Publicado em 2OO2 depois da morte de cinco pessoas, após o encerramento das estações de Serpins e Lousã)

A polémica estabelecida sobre a escolha entre metro de superfície ou comboio na linha da Lousã não me deixou indiferente e só afazeres de vária ordem me têm impedido de participar numa discussão tão importante quão decisiva para o futuro da Lousã.
Sou levado a reagir.
Ouvi no dia do acidente - péssima ocasião para abordar o tema - duas pessoas que me merecem muita consideração - manifestarem-se a favor do metro, quando o que estava em causa era um problema bem mais grave que era saber qual a influência do fecho de duas estações para o acidente.
Nenhuma dessas duas pessoas do auto-denominado Grupo de Cidadãos Lousanenses vivia na Lousã nos anos 50,60 ou 70, altura em que o caminho de ferro contribuiu de forma decisiva para o incremento industrial da Lousã.
Recordo que nesse período eram expedidas por dia da estação da Lousã largas dezenas de remessas para todo o país por empresas como as Alcatifas da Lousã, Companhia de Papel de Prado (que até tinha e tem um ramal próprio), Tipografia Lousanense, Licor Beirão e por todo o comércio e outras industrias locais. Eram centenas entre as expedidas e recebidas, pois daqui seguiam para as vilas interiores (Gois, Arganil, Pampilhosa da Serra) através de transporte rodoviário.
Os comboios faziam o trajecto de noite, sem inconvenientes para a população.
Nesse período essas largas dezenas de remessas eram expedidas em tarifas, pequena velocidade e tarifas especiais para todo o País e diga-se, com vergonha para os actuais transportes, que a maioria das remessas eram entregues NO DIA SEGUINTE em Lisboa, Porto, Faro, Bragança etc.
O orgulho e responsabilidade dos funcionários da CP na prestação de bons serviços eram um verdadeiro exemplo para toda a função publica.
Na década de setenta, o lobi rodoviário começou a tomar conta do País.
A melhoria das estradas, o aumento da fiabilidade dos transporte rodoviários, a comodidade do porta a porta, e sobretudo a falta de pulso dos admnistradores públicos nomeados para a CP por cartão político e não pela qualidade, levou a que os serviços ferroviários, começassem propositadamente a ser destruídos.
A falta de dinâmica e o “encosto” a interesses que não os ferroviários levava cada conselho de administração da CP a alterações quase mensais na gestão do transporte de mercadorias (só me quero reportar a estas) pois acompanhei passo a passo essa evolução. Quase todos os dias ía ao frio e desagradável barracão da estação da Lousã e por isso estou em condições de falar daquilo que vi e acompanhei.
Péssimo serviço, alienação de património, fecho de linhas, investimentos nulos no manuseamento de mercadorias etc. etc. levaram os industriais lousanenses a ter de optar pelos transportes rodoviários próprios ou de aluguer.
Sei bem como é agradável receber uma mercadoria no dia seguinte à porta da minha empresa. Mas que ninguém se iluda. Isto vai acabar e mais depressa do que pensamos. Ter a regalia duma viatura de 3.500 Kgs nos vir entregar um pacote de um quilo à nossa porta com custos relativamente baixos só é possível numa Europa totalmente virada para o transporte rodoviário.
Mas o aumento exponencial de trafego, vai acabar com esta situação. Essa comodidade durará quando muito mais uma vintena de anos.

Ainda agora, bastou a Espanha fechar a “FRONTEIRA” que eu julgava já não existir, para ver com os meus próprios olhos um espectáculo impressionante e preocupante. Trinta e cinco quilómetros de camions parados entre Vilar Formoso e a Guarda a aguardarem autorização para atravessar a Espanha. Preocupante pela fragilidade da nossa dependência de Espanha em termos rodoviários. E isso porquê ? Porque em Espanha não podem circular camions aos Domingos e Feriados. Não podem agora em 2002, porque daqui a meia dúzia de anos para circularem terão de pagar taxas elevadíssimas e aí lá voltarão os empresários a fazer contas e a ter de optar. Rodovia ou ferrovia.
Mas estes meus amigos que defendem o Metro saberão certamente, pois já cá viviam na Lousã que na década de 90, depois dos areeiros do rio Mondego terem sido fechados e/ou diminuídos todos os dias chegava à Lousã um comboio com areia de Constância que depois era transferida para camions que a distribuíam no nosso concelho e nos concelhos vizinhos.
Até isso acabou com o fecho da estação e em contrapartida temos vários camions que vão diariamente a Constância buscar areia do Tejo que fica muito mais cara aos industriais lousanenses, sem aqui querer contabilizar os custos para a nação na manutenção das estradas, aumento de trafego, desgaste de camions e sobretudo no aumento de acidentes. Promoverem a circulação de vários camions entre Lousã e Constância num serviço que um único comboio resolvia diariamente é não querer ver as vantagens do transporte ferroviário.
Foi este transporte ferroviário que pessoas de visão conseguiram há mais de 100 anos trazer para a Lousã, e que aqueles que em nada se importam de serem um subúrbio de Coimbra, querem preterir a favor dum Metro de superfície.
Desde que ouço falar do Metro não reparei e aqui penalizo-me publicamente, que a troca envolvia a mudança da bitola.
É aí, nesse pequeno grande pormenor. que reside quanto a mim o “busílis” da questão.
Querem trocar a acessibilidade da Lousã à rede ferroviária nacional, por um simples comboio suburbano.
Esses meus amigos quando falam nem sequer sabem que na década de 50 e 60 largas centenas de mirandenses e algumas dezenas de lousanenses (sempre fomos menos reivindicativos que os mirandenses pois tínhamos melhor estrada para Coimbra) lutaram e reclamavam contra a pressão que a imprensa de Coimbra fazia para acabar com o caminho de ferro dentro da cidade. Essa luta foi ganha por muitos que sentiam que o comboio era o nosso principal elo de ligação a todo o País.
Acabaram com a ligação à estação Nova já depois de se pensar no túnel ao lado do Mondego.
Digo-vos convictamente e sem fazer estudos ecológicos, sociológicos e outros que são da competência de especialista na matéria que os transportes rodoviários de longo curso têm os dias contados e muito mais depressa do que pensamos.
Na Europa, países como a Suiça, Áustria e outros já aplicam taxas de tal forma elevadas ao transporte rodoviário que muitos camionistas preferem colocar os atrelados nos comboios para no dia seguinte outros tractores da mesma empresa ou associados os levantarem perto do local de destino.
Anotem: Dentro de 20 anos no máximo a travessia de Espanha terá de ser feita por comboio e quem quiser levar o seu próprio camion terá de pagar muito mais caro.

E é neste período decisivo para todos nós que vejo lousanenses a pugnarem por um Metro de superfície.
Que não se importam que fiquemos isolados da rede ferroviária nacional
Que não percebem que no dia que toda a rede ferroviária nacional for alterada para a bitola europeia também o ramal da Lousã, se mantiver a actual bitola nacional, será igualmente contemplado.
Que desejam os milhões que virão da UE, mas não se preocupam com os 5 milhões que deitam fora ao levantar uma linha que foi colocada há pouco mais de uma década.
Que não entendem que o dinheiro que poderá vir da UE terá para a Lousã a mesma consequência que os subsídios europeus tiveram para a nossa agricultura ou seja, acabaram com ela.
Acordem. Não se deixem levar por uns passeios de metro. Reajam. Digam não aos “lobis” rodoviários. Obriguem o estado a investir na Linha da Lousã.

Para isso, se mais não puder ser feito gastem as vossas energias para que a CP, REFER ou outro organismo entretanto criado (já são tantos a mandar no transporte ferroviário que lhe perdi a conta) resolvam o problema do ramal da Lousã sem terem de nos isolar por 3 ou 4 anos se tiverem de levantar os actuais carris. Seria catastrófico para os lousanenses fechar a linha por um período tão dilatado.
Solução que preconizo:
Compra imediata de novas automotoras (não as remendadas a fibra de vidro) com acelerações e travagens rápidas e alterem o perfil das estações para não sermos forçados ao triste espectáculo de ver pessoas idosas a “treparem” para as automotoras com portas de 70 cms que só deixam entrar ou sair pessoas uma a uma.
Por favor não obriguem a industria lousanense a ter de procurar daqui a 20 anos zonas industriais servidas por caminho de ferro.
Quem escreve recebe ou envia da Lousã mais de 3 semi-trailers de mercadoria por dia.
Até quando. Até ser mais barato e cómodo que o péssimo serviço de caminho de ferro que temos.
Finalmente, não queiram transformar a Lousã num subúrbio de Coimbra e quando pensarem em transporte ferroviário, pensem que ele não serve só para passageiros, mas serve igualmente para mercadorias. E quanto mais rentável for nas mercadoria mais os futuros governantes poderão investir nos passageiros.
Não vos quero tomar mais tempo.
A propósito. Na década de 60 para além das manifestações em que participei na luta pelo caminho de ferro, publiquei artigos a defender o transporte ferroviário em jornais como o Diário de Lisboa, Républica e Expresso.

José Redondo

5 Comentários:

Blogger Chico Torreira disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

4:48 da tarde  
Blogger Chico Torreira disse...

Muito ilucidativo.
Sem este artigo não teria lido o
que saíu no "O TREVIM" DA LOUSÃ. Obrigado

4:56 da tarde  
Blogger Manuela Curado disse...

Espantosamente este artigo continua actual.


Estive em Coimbra há uma semana e ao passar de carro pelo antigo apeadeiro de caminho de ferro do Calhabé comentei para quem me acompanhava, sobre as possíveis dificuldades que teriam os seus antigos utentes, para chegar a Coimbra.
A partir daqui desenvolveu-se um diálogo sobre a construção do tão famigerado metro que desde o primeiro momento achei uma ideia surrealista para cidade tão pequena e direi mesmo, pacata.
Durante todos estes anos gracejei com este intuito de algumas "mentes brilhantes", na suposição, porém, de que já que iniciados, os trabalho iriam até ao final.
O "irreal" afinal confirmava-se e agora nem metro nem comboio.
Os erros têm sido sucessivos e agravados pela incompetência e gosto duvidoso dos que têm guiado os destinos desta antiga, bela cidade.
Agora encontra-se decrépita e agonizante(basta ver a o horror, feito na Praça 8 de Maio)
Não fora a nossa intrépida "BRIOSA"e o meu desgosto seria mortal...

5:36 da tarde  
Blogger Manuel Cruz disse...

Esta mensagem merece que, mais do que a sua divulgação já de si importante, se faça dela geradora de um debate que é urgente seja aprofundado.
É preciso que, de uma vez por todas, Coimbra e a sua região voltem a entrar nos «carris».
Vai para perto de cinquenta anos trabalhei como desenhador para o arquiteto Jorge Sampaio, primeiro no ateliê da Simões de Castro e depois na Fernão de Magalhães, tendo feito uns riscos nalguns projectos como o complexo turístico do Pego Negro e um estudo para a projectada Avenida da Lousã, que teria o traçado do ramal ferroviário entre a Portagem e o Calhabé. Dizia ele que a linha férrea de veria ser sempre um importante elemento orientador do ordenamento das cidades.
Depois, mais tarde, assisti com uma enorme amargura ao arranque das linhas do nosso eléctrico, um acto de estupidez absoluta. Que não acabou.
Arrancar carris é como apagar um pouco da civilização. Ergamos bem alto a o nosso protesto.

7:10 da tarde  
Blogger RI-RI disse...

Era a 3ª cidade do país...

7:45 da tarde  

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial

Powered by Blogger

-->

Referer.org